Por mais incrível que possa parecer, é bastante comum a criação de normas municipais infringindo os limites para emissões sonoras estabelecidos em lei federal.
Esse costume acaba por onerar, desnecessariamente, o Estado, que acaba, em algum momento, declarando a inconstitucionalidade dessas normas e a desinformar o cidadão sobre os verdadeiros limites vigentes.
Para ilustrar o tema trazemos quatro precedentes nos quais a inconstitucionalidade da lei municipal acabou por ser declarada.
Para quem gostar de ler, vale a pena examinar a íntegra dos acórdãos, cujo link se encontra ao final de cada referência.
Recomendável, outrossim, cuidado especial na escolha do seu próximo vereador, examinando se ele não se encontra entre aqueles que subscrevem esse tipo de norma.
1) Município de Suzano no estado de São Paulo
“Ação direta de inconstitucionalidade. Município de Suzano. Lei Complementar nº 288, de 03 de março de 2016, que “altera a redação do inciso III do artigo 18 da Lei Complementar nº 256 de 18/12/14, e dá outras providências”. Norma que contraria as regras gerais estabelecidas pela União, excluindo ruídos causados por cultos religiosos, templos ou igrejas de qualquer natureza, no horário compreendido entre 8h e 22h. Sujeição às resoluções CONAMA nº 001/90 e nº 002/90 e às normas da Associação Brasileira das Normas Técnicas – ABNT. Afronta ao artigo 144 da Constituição Estadual. Inconstitucionalidade declarada. Ação procedente” (ADIn 2257969-96.2016.8.26.0000, Órgão Especial do TJSP, j. 05.07.17, rel. João Negrini Filho, v.u.).
Excerto do acórdão: “(…). Não obstante a possibilidade de edição de normas, pelo Município, que visem a proteção ao meio ambiente, o diploma legal impugnado (Lei Complementar nº 288/2016) afronta o princípio do pacto federativo, pois a matéria ali tratada é regulada por normas federais, dada a competência legislativa da União, que estabeleceu regras gerais acerca da poluição sonora. Neste ponto, bem observou a douta Procuradoria Geral de Justiça: ‘(…) A pretexto de exercer competência suplementar com fundamento no art. 30, II, da Constituição da República, não há espaço para o legislador municipal sobrepor normas locais à regulamentação da União, afastando o controle de emissão de ruídos provocados por cultos religiosos, templos ou igrejas de qualquer natureza no período das 8 às 22 horas. A competência suplementar do município aplica-se, nos assuntos que são da competência da legislativa da União ou dos Estados, àquilo que seja secundário ou subsidiário relativamente à temática essencial tratada na norma superior. Na hipótese em questão, caberia ao Município, diante dos usos e costumes locais, definir qual seria o período considerado como diurno ou noturno, mas não afastar a vedação da produção de ruídos em determinado período. A Lei Complementar nº 288, de 03 de março de 2016, do Município de Suzano, suplanta os limites da autonomia municipal radicados nos incisos I e II do art. 30 da Constituição Federal e invade a competência concorrente legislativa da União e Estados relativa à proteção do meio ambiente e ao controle da poluição contida no art. 24, VI, da Constituição Federal, ao permitir, sem qualquer limite de intensidade, a propagação de ruídos das 08 às 22 horas por determinados estabelecimentos. (…)”.
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2) Município de Sorocaba no estado de São Paulo
“Ação Direta de Inconstitucionalidade. Art. 37 da Lei nº 11.367, de 12 de julho de 2016, de iniciativa parlamentar, dispondo sobre o controle e a fiscalização das atividades que gerem poluição sonora, impõe penalidades e da outras providências, no Município de Sorocaba. Dispositivo que isenta igrejas e templos religiosos das sanções e penalidades previstas na Lei Municipal nº 11.367/2016. Inadmissibilidade. Violação ao pacto federativo. Ocorrência. Inviável norma local isentar seja qual for o agente causador de ruído, inclusive cultos religiosos, dos padrões de controle de ruído de regulação geral. Necessário observar a Resolução CONAMA nº 001/90. Violação ao princípio da isonomia/igualdade. Ofensa caracterizada. Dispositivo isenta somente igrejas e templos religiosos das sanções previstas na norma. Inadmissível distinção não prevista em legislação federal. Afronta a preceitos constitucionais (arts. 1º, 111, 144 e 191 da Constituição Estadual). Procedente a ação” (ADIn 2256472-47.2016.8.26.0000, Órgão Especial do TJSP, j. 21.06.17, rel. Evaristo dos Santos, v.u.).
Excerto do acórdão: “(…). Em que pesem os argumentos do Chefe da Casa Legislativa Municipal, a matéria tratada no art. 37 da Lei Municipal nº 11.367/16, isentando igrejas e templos religiosos das penalidades da norma (Art. 37. As Igrejas ou templos religiosos que tiverem dado entrada no pedido de regularização, ficarão isentos de qualquer penalidade prevista nesta Lei. (Veto Parcial nº 42/2016 Rejeitado).” fls. 60), afronta o pacto federativo. A Constituição Federal confere aos Municípios competência para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, inciso I) e suplementar a legislação federal e estadual, no que couber (art. 30, II). Todavia, o art. 37 da Lei Municipal nº 11.367/16, está em desacordo com norma federal (Resolução CONAMA nº 001/1990) que regula a matéria. A autonomia conferida aos Municípios pode ser exclusiva, no que se refere ao interesse local (art. 30, I) ou concorrente (art. 30, inciso II, da Constituição Federal, “suplementar a legislação federal e a estadual no que couber”).
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3) Município de Colatina no estado do Espírito Santo
Excerto do acórdão: “(…). A proteção do meio ambiente e o controle da poluição – inclusive a sonora – não se inserem na categoria de matérias de interesse predominantemente local. Ao contrário, ante a natureza difusa dos bens ambientais, a proteção do meio ambiente e o controle da poluição em qualquer das suas formas transcende o interesse local, razão pela qual demanda atuação conjunta de todos os entes da Federação (CF/88, art. 23, VI). Ainda, ‘[a] competência constitucional dos Municípios de legislar sobre interesse local não tem o alcance de estabelecer normas que a própria Constituição, na repartição das competências, atribui à União ou aos Estados’ (STF, RE 313.060, Ministra Ellen Gracie, DJ de 24/02/2006). Logo, uma vez atribuída à União, aos Estados e ao Distrito Federal a competência para legislar de forma concorrente sobre ‘proteção do meio ambiente e controle da poluição’ (CF/88, art. 24, VI), não se revela admissível que aos Municípios seja autorizado legislar sobre o controle da poluição sonora sob o fundamento de se tratar de matéria de interesse local. Assim, a competência para os Municípios legislarem sobre o controle da poluição sonora não encontra fundamento no art. 28, I, da Constituição Estadual (ou no art. 30, I, da Constituição Federal), mas no inciso II, do mesmo artigo (e correspondente inciso II, do art. 30, da Constituição Federal). Ocorre que o exercício da competência outorgada aos Municípios para suplementar a legislação federal e estadual ‘há de respeitar as normas federais e estaduais existentes’ (MENDES, Gilmar Ferreira et alli. Curso de direito constitucional. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 824). Isto é, as normas municipais suplementares não poderão contrariar as normas federais e estaduais, disciplinando, de forma diversa, aquilo que já foi objeto de regulação pelas normas federais e estaduais” (ADIn 0011781-35.2014.8.08.0000, Tribunal Pleno do TJES, j. 03.03.15, rel. Fábio Clem de Oliveira, v.u.).
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4) Município de Itapetininga no estado de São Paulo
“Ação direta de inconstitucionalidade. Município de Itapetininga. Lei municipal nº 6.146, de 22 de julho de 2016, que ‘dispõe sobre o controle de ruídos, sons e vibrações no município de Itapetininga e dá outras providências’. Norma que trata de proteção ao meio ambiente, mas que contraria as regras gerais estabelecidas pela União. Existência de Resoluções do CONAMA, nºs 001/1990 e 002/1990, que fixam critérios e níveis máximos de emissão de sons e ruídos para ambientes diversos. Diploma legal que extrapola os níveis máximos permitidos. Afronta ao artigo 144 da Constituição Estadual. Inconstitucionalidade declarada. Ação procedente” (ADIn 2179559-24.2016.8.26.0000, Órgão Especial do TJSP, j. 03.05.17, rel. João Negrini Filho, v.u.).
Excerto do acórdão: “(…). Não obstante a possibilidade de edição de normas, pelo Município, que visem a proteção ao meio ambiente, o diploma legal impugnado (Lei nº 6.141/2016) afronta o princípio do pacto federativo, pois a matéria ali tratada é regulada por normas federais, dada a competência legislativa da União, que estabeleceu regras gerais acerca da poluição sonora”.
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